quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Comentário - Simulação de Julgamento

Em relação à resolução da presente hipótese, em primeiro lugar deveremos analisar o efeito jurídico da recusa do visto prévio do Tribunal de Contas relativamente ao contrato de empreitada e concessão da auto-estrada A 5401. Desta forma, analisada prima facie a Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, Lei 98/97, de 26 de Agosto, com as alterações introduzidas pelas Leis nº 35/2007, de 13 de Agosto e 48/2006, de 29 de Agosto, verificamos que a fiscalização prévia visa verificar se os actos e contratos estão conforme as leis em vigor e se os respectivos encargos têm cabimento em verba orçamental própria.
Resumidamente, dispõe o artigo 45º, do supra diploma legal, que os actos e contratos sujeitos a fiscalização prévia do Tribunal de Contas podem produzir os seus efeitos antes da emissão do visto, ou seja nada obsta, a que a obra se tivesse iniciado sem a emissão do visto prévio.
Em relação ao momento posterior da recusa da emissão do visto prévio, resulta da análise do referido diploma que esta recusa leva à ineficácia jurídica dos respectivos actos e contratos. Refere ainda o n.º 3 deste preceito que “Os trabalhos realizados ou os bens ou serviços adquiridos após a celebração do contrato e até à data da notificação da recusa do visto poderão ser pagos após esta notificação, desde que o respectivo valor não ultrapasse a programação contratualmente estabelecida para o mesmo período.” Assim, nada impede que os trabalhos até agora realizados sejam pagos desde que cumpram os requisitos acima identificados. Já quanto à interpretação que as 3 entidades intervenientes fizeram do alcance da recusa do visto prévio, parece-me descabida tal interpretação pois os efeitos deste não incidem apenas num entorpecimento do processo de pagamento, mas sim, e como vimos, na “ineficácia jurídica dos respectivos actos e contratos”.
De seguida, passaremos a analisar quais os mecanismos jurídicos que Francisco Esperto, presidente do conselho de Administração da construtora “Auto-Betão” dispõe no Contencioso Administrativo para parar com obras. Parece-me que estamos no âmbito da Acção Administrativa Comum, pois de acordo com o artigo 37º n.º 2 alínea h) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) esta situação está relacionada com a validade e execução de um contrato. Ao abrigo do art. 40º n.º 2 alínea e) CPTA tem, Francisco Esperto, legitimidade processual visto ter participado no procedimento que precedeu à celebração do contrato. Considerando a urgência manifestada, é aconselhável que este coloque uma providência cautelar conjuntamente com a acção principal. Não poderá no entanto colocar uma acção de impugnação urgente, visto esta, no que respeita a contratos, ser apenas para procedimentos pré-contratuais, como dispõe o art. 100º do CPTA. Retomando a intenção de colocar uma providência cautelar, prevê o art. 112º n.2 alínea f) a intimação para a adopção ou abstenção de uma conduta, ou seja levar a que as 3 entidades se abstenham de prosseguir as obras por violação de normas de direito administrativo. Este pedido deverá ser formulado no momento e forma previsto no art. 114º do CPTA.
Quanto a uma acção popular, consagrada no artigo 52º da nossa Constituição, este mecanismo com a reforma da Revisão Constitucional de 1989, consumada depois na Revisão de 1997, veio a consagrar a possibilidade de ser usado contra actuações de particulares regidas pelo direito privado e ainda como mecanismos de prevenção, cessação ou perseguição de actuações lesivas exigidos pelas circunstâncias do caso concreto. Assim, e tal como dispõe o art. 9º n.º 2 do CPTA, Francisco Esperto poderia alegar que a actuação manifestada pelas 3 entidades poderia por em causa a salvaguarda dos bens do Estado, lesando este de forma clara e abusiva.
Termino referindo que, mesmo sabendo que a actuação dos Tribunais nem sempre se pautarem por uma actuação célere, parece-me que a emissão do visto prévio deveria incidir antes do inicio da execução dos contratos, e não já no decorrer dos mesmos. Os benefícios que esta medida traria seriam certamente muito superiores aos inconvenientes decorrentes da morosidade que certas situações poderiam configurar. Tal como o próprio nome indica, este visto é prévio a algo, e este algo não me parece que seja à execução final do contrato.

Domingos Franco Afonso - Aluno n.º 17238